sexta-feira, 30 de maio de 2014

Cansaço





Começo a estar cansado de lutar por uma mudança substantiva no nosso paupérrimo panorama ideológico-político. 
As transmutações recentes a que fui sujeito, pela redução recorrente nos níveis de saúde, dinheiro e concomitantes expectativas, limitaram a minha paciência e contribuíram decididamente para minar-me a mente e o corpo, deixando-me, cada dia que passa, com menor capacidade de resiliência.

Confesso que os resultados das recentes eleições, não obstante nada resolverem de fundo, deram-me algum conforto, pois desde longa data que venho pugnando (nomeadamente neste espaço) por uma atitude sufragista dos cidadãos, que demonstrasse, claramente, o desagrado e repulsa à prática implantada da partidocracia. Como forma introdutória inicial sugeri a abstenção, mais tarde, recorrentemente, advogando o voto nulo ou branco, como forma mais eficaz, logo consequente.

Não obstante esse parco conforto, mantenho uma desconfiança latente, que se vai inculcando cada dia que passa, estado de espirito baseado na auscultação das diferentes reacções políticas, (provenientes de todas as colorações) quer locais, quer genericamente por toda a Europa, pois embora revelem alguma diferença discursiva ─ reconhecendo parcialmente que a sua acção foi deficiente, admitindo até ser necessário mudar de politicas ─ não são suficientemente convincentes, por falta de substrato, a ponto de me levarem a acreditar que tais intenções, não passam disso mesmo, mais uma vez, demonstrativas de vacuidade e ausência de honestidade.

Quem me lê regularmente, sabe que por sistema e defeito, não costumo efectuar análises críticas de caracter partidário. Todavia a recente ocorrência que envolve o PS é bem demonstrativa do que venho criticando a toda a partidocracia em geral. O domínio dos aparelhos partidocráticos acaba por provocar a entropia aparente do sistema, bloqueando o desenvolvimento de ideias, numa primeira fase a nível partidário, acabando por alastrar a todo o tecido político activo, actuando como tampão de completa inexpugnabilidade à mudança.

 A questão fulcral será portanto saber se a interpretação dos resultados eleitorais virá ainda ou não a revelar algum bom senso e corresponder, por isso, a mudanças substantivas nos comportamentos e políticas, por forma suficientemente clara, evidente e consequente que seja sentida, a curto prazo pelos cidadãos como uma intenção política genuína, traduzida em práticas reais na sua aplicação.

Esperemos que a costumeiras e enfadonhas ladainhas, apresentadas nas falaciosas retóricas para débito mediático desapareçam, e, em seu lugar, apareça obra-feita em efectivo benefício dos cidadãos. Para tal será necessário que as partidocracias, desmontem e aniquilem parte das suas estruturas ancilosantes, colocando os seus membros mais válidos e lúcidos a dialogarem, obtendo entre si plataformas/compromisso de base mínima para assuntos essenciais, falando claro, apresentando, sem inibições os seus projectos para prazos imediato, mediato e mais longínquo.

A largura do espectro político não deverá, à partida, excluir qualquer coloração ou posição partidária. Se os objectivos forem claros e abertos ao conhecimento público, o exercício da auto-exclusão e das suas razões, deverão ser igualmente do conhecimento publico.

Se isso não vier a suceder, receio que os sinais agora demonstrados pelos cidadãos através da sua intenção de voto não tenham conseguido modificar nada. Teremos, nesse caso, de recriar  massa crítica suficiente para tentar transformar toda, ou a maior parte da abstenção, em votos nulos ou brancos. Essa será certamente uma penalização à qual a partidocracia não poderá, de novo, pretender mostrar ignorância ou alheamento.
Para análise e reflexão, junto abaixo um quadro comparativo com os resultados globais mais relevantes das eleições de 2009 e 2014.


2009
2014
Votos expressos
36,77
33,89
Votos Brancos
4,63
4,41
Votos nulos
2,00
3,06
Total Brancos+Nulos
6,63
7,47
Abstenção
63,23
66,10
Nota: Valores em %


J, Ferreira

terça-feira, 22 de abril de 2014

POBREZA NÃO DEVE SER UMA SENTENÇA PERPÉTUA



Como já é do conhecimento quer de familiares, quer de amigos mais próximos ou dos que possuo há mais tempo, sou ateu.

Não obstante esse facto, reconheço a utilidade ─ em tempo de crise ou não ─ de algumas organizações, maioritariamente de iniciativa, dependentes ou subordinadas a ordens ou seitas religiosas ou similares, algumas, poucas, a organizações internacionais desvinculadas das áreas religiosas.

Revejo-me portanto na essência Humanista dos princípios, propósitos e desempenhos da maioria dessas organizações, cuja acção meritória, depende, na sua maioria, da esmola de quem tem alguma coisa que ainda possa contribuir para os que muito pouco ou nada possuem.

Olhando à nossa volta, vendo com isenção o que se tem passado e passa no nosso país, compreender-se-á, sem grande perplexidade, a origem das dificuldades que algumas dessas organizações enfrentam presentemente.

De facto, parte significativa dos que contribuíram, mesmo que modestamente, estão hoje, eles próprios em dificuldades tendo deixado de poder contribuir. Alguns até, tendo sido contribuintes num passado recente, encontram-se hoje na situação de requerer, por indigência superlativa, o apoio que antes facultaram a outros.

É, quer queiramos quer não, o resultado de políticas que têm vindo a ser aplicadas a nível global, com especial incidência na Europa e, dentro desta, em países governados por gente seguidista, autista, sem competência e sensibilidade social, sobretudo coniventes com o princípio ideológico dogmático de que o Povo tem de ser pobre para melhor obedecer.

Como é evidente, nestas circunstâncias e situação de pobreza dos cidadãos, a função e acção das entidades e Organizações de Caridade torna-se um instrumento fundamental, mesmo que os governos queiram fazer crer que são eles os impulsionadores desses apoios.

Ao contrário, no extremo oposto da pirâmide, a riqueza engrossa despudoradamente os seus proventos, alguns obtidos com a desgraça dos que já pouco tinham. Estes, invariavelmente, possuem melhor e mais eficaz protecção dos governos.

Todos sabemos, incluindo os governos e todos os partidos políticos, que assim é. Os bancos, os representantes e detentores do poder financeiro, bem como todos os seus agentes, sabem que assim é. Por isso, para a maioria dos cidadãos, viver nas circunstâncias actuais tornou-se um acto de coragem. Trata-se afinal de tentar sobreviver, mais do que viver.

É incontestável que não poderá haver Democracia sem partidos políticos. Partidos políticos, sobretudo os do chamado arco-de-governação, como estão é que não. Todos nós, cidadãos lúcidos, temos obrigação de esclarecer os que ainda tenham dúvidas sobre as consequências em manter o estado actual de coisas. Trata-se simplesmente de evitar a implantação definitiva de um novo regime político encetada há três anos. Trata-se afinal, de evitar a institucionalização da pobreza como forma normal de vida.

Zé Ferreira

22-04-2014

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Ficar ou sair da União Europeia? Eis a questão



a liberdade não é um ser: é o ser do homem, quer dizer, o seu nada de ser. (...) O homem não pode ser ora livre, ora escravo; ele é inteiramente e sempre livre, ou não é.
Jean-Paul Sartre, in 'O Ser e o Nada' 


Atentemos ao que sucedeu recentemente nas eleições francesas. É de facto resultado da aplicação de políticas alegadamente de esquerda, que esbarraram no já saturado e sofrido sentimento de desconfiança, desilusão e constatação factual dos cidadãos, quanto à sua ineficiência e concomitante agravamento das condições de vida dos cidadãos em geral, empurrando-os, desta maneira, para o voto à direita.

Assim se compreenderá a severa derrota da esquerda, com a evidente vitória da direita incluindo a extrema direita, (FN) esta última agora vestida de roupagens bem mais moderadas, mas, sem dúvida, com ideias socialmente bem diversas daquelas que os partidos de esquerda alegadamente defendiam, mas não praticaram.

Foi portanto o reflexo da desilusãio dos franceses, preço que François Hollande e o PS francês  pagaram pela falta de visão e prática falaciosa em política, aplicando medidas seguidistas impostas pelas cabeças dominantes na Europa. Este não terá sido um acontecimento evanescente, irá pelo contrário repetir-se, com idêntico resultado, nas próximas eleições Europeias.

Claro que desta vez o mal será geral, não só o da França. As excepções serão possivelmente Portugal onde a extrema direita não possui, ainda, representação significativa, ou está sériamente comprometida com a presente miséria que se vive em Portugal. Este panorama premonitório, leva-nos à questão central que se circunscreve ao futuro da Europa tal como se encontra actualmente.

Não obstante já se sentir um sentimento latente na necessidade de mudança ─ encarando os reais problemas estruturais da europa, sobretudo quanto às diferenças da riqueza produzida entre no norte e sul ─ não será credível prever a disponibilidade dos países do norte em aceitar prescindir de parte da sua riqueza, em benefício dos países do sul.

As mudanças estruturais a implantar seriam de tal modo gravosas que implicariam mudanças socialmente penosas para os cidadãos dos países abonadores, que liminarmente viriam a ser, como já são em parte, rejeitados pelos políticos e cidadãos desses países,

Assim, quer queiramos, quer não, teremos de ser confrontados com a inexorável divisão da Europa a dois níveis, ou blocos, seja qual for o nome que viermos a escolher: o bloco norte e o bloco sul, ou mais depreciativamente, os países Europeus do norte e os países Europeus do sul, periféricos aos restantes..

Alternativamente, de moto-próprio ou empurrados, a saída da União Europeia será outro cenário a considerar como admissível, embora previsivelmente, mais doloroso. Claro que pela gravidade, premência e complexidade técnica envolvidas, este assunto ─ numa ou noutra modalidade ─ já  deveria ter sido objecto de espaço para uma ampla e séria discussão. Virá, estou certo, a sê-lo após as próximas eleições europeias.

Não sei se nessa altura já não será tarde, mas certamente será bem mais doloroso do que teria sido se se tivesse considerado, atempadamente essa possibilidade. Por outro lado, a nossa permanência tal como estamos, continuará a penalizar-nos como até aqui, sem qualquer horizonte de melhoria de vida dos cidadãos, a curto, médio e longo prazos.

Será portanto fundamental pressionarmos a discussão deste assunto por forma isenta de dogmatismos ideológicos, com isenção intelectual suficiente para que Portugal possa de novo vir a sobreviver,  sem ilusões, dentro das suas limitações, mas com dignidade, sem estar reduzido à condição de pedinte de esmolas envenenadas, sempre a um clube de ricos; que nos considera de segunda classe, mas nem sequer tem o rebuço em exibir os ganhos da sua usura.
Valerá por certo bem mais comermos o nosso repolho, do que nos engasgarmos com a couve de Bruxelas.

Zé Ferreira – 02-04-2014